quinta-feira, 30 de outubro de 2008

Rádio Comunitária

Rádio Comunitária: uma ferramenta na democratização da comunicação
Meyrilane da Silva Gomes*

O Movimento de radiodifusão comunitária nasceu no bojo do movimento pela democratização da comunicação e da sociedade. Este, por sua vez, emergiu do conjunto dos movimentos sociais em luta pela transformação social no Brasil. E, como partícipes das redes de movimentos, em esfera mundial, estes atuam nos embates contra o projeto da globalização neoliberal.

De acordo com Ferraretto (2001) o processo de lutas sociais aqui no Brasil pela democratização da comunicação vem durando por quase duas décadas. Com argumentos de oposição à rádio comunitária os empresários do setor radiofônico dizem que as estações “clandestinas”, referindo-se à radiodifusão comunitária, interferem nos sinais das emissoras legalmente constituídas e nos sistemas de comunicação dos aviões nas proximidades de aeroportos.

A situação de antipatia com a Radiodifusão Comunitária foi tamanha que em novembro do ano de 1996 a Associação das Empresas de Rádio e TV (AESP) e o Sindicato das Empresas de Rádio e TV (SERTESP), ambas de São Paulo, lançaram uma campanha com o slogan: “Rádio pirata: só as autoridades não interferem”, daí percebemos como foram e ainda são ferrenhas as lutas sociais no processo da democratização radiofônica.

Segundo o Ministério das Comunicações o Serviço de Radiodifusão Comunitária brasileira foi criado pela Lei 9.612, de 1998, regulamentada pelo Decreto 2.615 do mesmo ano. Existem atualmente no Brasil 2.470 rádios comunitárias legalizadas, 1.200 em processos de outorga tramitando e cinco mil requerimentos.

A Radiodifusão Comunitária (RadCom) trata-se de um serviço de radiodifusão sonora em freqüência modulada (FM), de baixa potência (25 Watts) e cobertura restrita a um raio de 1 km a partir da antena transmissora. Podem explorar esse serviço somente associações e fundações comunitárias sem fins lucrativos, com sede na localidade da prestação do serviço. As estações de RadCom devem atender a uma programação pluralista, sem qualquer tipo de censura, e devem ser abertas à expressão de todos os habitantes da região atendida.

Ainda de acordo com o Ministério das Comunicações a finalidade dos serviços da RadCom é atender a comunidade onde esta inserida dando a ela a oportunidade da difusão de idéias, elementos de cultura, tradições e hábitos sociais da comunidade, oferecendo à mesma mecanismos de formação e integração, onde estimularia o lazer, a cultura e o convívio social. Dessa forma a RadCom prestaria um serviço de utilidade pública, integrando-se aos serviços de defesa civil, sempre que necessário, dando assim a capacitação dos cidadãos no exercício do direito de expressão, de forma mais significativa.

Esse tipo de rádio caracteriza-se por estar organizada a partir da prática da comunicação comunitária popular-alternativa , ou seja, por pessoas que fazem parte ou não nos movimentos sociais organizados, com um projeto pedagógico libertador, partindo do cotidiano dessas, contribuindo para que elas reflitam sobre a sua realidade através da comunicação feita por e com elas mesmas. Mas antes, é bom salientar que a comunicação comunitária é aquela que se organiza a partir do cotidiano de pessoas em uma determinada comunidade, independente de estarem ou não organizadas em movimentos sociais. Ela possibilita a expressão do cotidiano da comunidade fora dos padrões modalizados, gerando um processo de singularização.

É relevante dentro desse contexto, destacar a função social das rádios comunitárias. Para Meliani (1995), “os pequenos projetos de comunicação, quando localizados e integrados à realidade de suas comunidades, são capazes sim de produzir conteúdos de qualidade, garantir audiência dando respostas às necessidades da população”.

A enfatização de Meliani, sobretudo quanto às rádios comunitárias darem respostas às necessidades da população, lança-se para a amplitude do que se constitui como função social desse instrumento de comunicação, pois essas respostas são buscadas pela própria população que percebe quais são essas necessidades. Nesse contexto, a rádio comunitária teria por objetivo principal transformar o ouvinte em sujeito ativo e participante da comunicação, ele produziria a informação opinando sobre os fatos, abrindo assim a possibilidade de discussões ampla das problemáticas e características intrínsecas daquela comunidade onde se insere.

Para se ter a obtenção desse serviço de radiodifusão de acordo com Ferraretto (2001) faz-se necessário as seguintes recomendações:

1) O primeiro passo inclui a constituição de uma associação comunitária, que encaminha um requerimento ao Mistério das Comunicações;

2) A agência de Telecomunicações verifica, então, se a área de interesse faz parte da região de utilização do canal nacionalmente definido para o Serviço de Radiodifusão Comunitária (RadCom). Caso negativo, será indicada uma alternativa pela Anatel.

3) Constatadas as possibilidades técnicas, o Ministério das Comunicações publica, no Diário oficial, comunicado de inscrição para habilitação das entidades interessadas em prestar o serviço da mesma área solicitada ou em área com o centro deslocado em até 500 metros de origem.

4) A partir da data de publicação do Diário Oficial, decorre um período de 45 dias, em que todas as entidades interessadas devem encaminhar requerimento à Delegacia do Ministério das Comunicações, anexando a documentação necessária.

5) Caso somente uma entidade se inscreva, o Mistério das Comunicações expede a autorização para que a emissora passe a operar. Havendo mais de uma associação interessada e habilitada a prestar o serviço, o ministério tenta um entendimento entre elas, o que tem prazo de 30 dias para ocorrer. Caso isto não aconteça, a escolha acontece pelo critério da representatividade. Quem obtiver maior numero de manifestações de apoio à entidade ou integrantes da comunidade terá direito a operar a emissora. Concluindo que existe igual representatividade, a escolha ocorre em um sorteio.

6) Selecionada a entidade, esta deve encaminhar os dados técnicos e operacionais à secretária de radiodifusão em um prazo de até 30 dias, estabelecido pela SSR.

7) Estando tudo correto do ponto de vista técnico e jurídico, o Ministério das Comunicações publica o resumo do ato de autorização no Diário Oficial.

8) A emissora deve entrar no ar em um período de seis meses a contar da data de publicação do ato no Diário Oficial.

O ato de autorização da radiodifusão comunitária somente produzirá efeitos legais após deliberação do Congresso Nacional, nos termos do parágrafo único do art. 2º da Lei n.º 9.612, de 1998, publicada em ato competente. A autorização terá validade de três anos, permitida a renovação por igual período, se cumpridas as disposições previstas nesta Norma. A cada entidade será expedida apenas uma autorização para execução do RadCom.

É bom salientar que a emissora do RadCom operará sem direito a proteção contra eventuais interferências causadas por estações de Serviços de Telecomunicações e de Radiodifusão regularmente instaladas. Porém, caso uma emissora de RadCom provoque interferência indesejável em Serviços de Telecomunicações e de Radiodifusão regularmente executados, a Anatel estabelecerá o prazo máximo de 48 horas para a eliminação da causa da interferência e, não sendo esta eliminada, determinará a interrupção do serviço da emissora interferente até que cesse a interferência.

Uma outra exigência estabelecida às emissoras de RadCom é manter a Licença de Funcionamento de Estação permanentemente exposta num local visível, onde se encontra o transmissor. Essas emissoras cumprirão período de oito horas, contínuas ou não, como tempo mínimo de operação diária e sempre que a entidade pretender alterar o horário de seu funcionamento deverá comunicar o fato ao Ministério das Comunicações com antecedência mínima de cinco dias úteis da data de efetivação da alteração.

A entidade autorizada a executar o serviço de RadCom não pode estabelecer ou manter vínculos que a subordinem ou a sujeitem ao gerenciamento administrativo de qualquer outra entidade, mediante compromissos ou relações financeiras, religiosas, familiares, político-partidárias ou comerciais.

Com autorização da execução desse serviço radiofônico a entidade deverá manter disponível e atualizado o nome e o endereço residencial de cada um de seus dirigentes, para qualquer solicitação ou inspeção do Ministério das Comunicações, além de toda a programação veiculada na rádio ser gravada e mantida em arquivo durante as 24 horas subseqüentes ao encerramento dos trabalhos diários da emissora, devendo também ser conservados em arquivo os textos dos programas, inclusive noticiosos, devidamente autenticados pelos responsáveis, durante sessenta dias.

A instalação e funcionamento de uma estação de rádio comunitária sem a devida autorização são considerados crimes Federais, punindo o infrator com a prisão e a apreensão dos equipamentos. Essa penalidade é aplicada não somente ao proprietário da estação clandestina, como também a todos aqueles que, direta ou indiretamente, estejam ligados a essa atividade ilegal.

Uma outra questão que gostaríamos de trazer a nossa discussão sobre rádio comunitária é que o processo de uma democratização da comunicação dentro de uma comunidade, seja ela qual for, não é algo tão fácil assim. Uma comunidade é formada por uma variedade de entidades que têm suas próprias ideologias muitas vezes divergentes, onde reunir essa heterogeneidade de pensamentos num mesmo espaço em prol do mesmo objetivo é um processo de construção de trabalho árduo, gradual e continuo.

O processo de conscientização de comunicação comunitária deveria ser feito dentro das comunidades que possuem esse meio de comunicação, com tal trabalho teríamos um maior impacto dentro da relação rádio e comunidade, para que essa entenda a utilização desse instrumento de comunicação no atendimento a uma coletividade e não a um grupo especifico da comunidade.

Em suma, com essas observações teríamos a rádio comunitária atendendo o seu objetivo principal que é transformar o ouvinte em sujeito ativo e participante da comunicação, produzindo a informação, opinando sobre os fatos, abrindo assim a possibilidade de discussões das vontades daquela localidade, constituindo uma democratização real da comunicação.

Referência
FERRARETTO, Luiz Artur. Rádio: o veículo, a história e a técnica. 2ª ed. Porto Alegre: Sagra Luzzatto, 2001.

* Mayrilane da Silva Gomes é graduada em Comunicação Social, habilitação Radialismo, pela UFPB. (com revisão de HM)
Parte da monografia “Rádio comunitária: a reação da comunidade de São Rafael com sua rádio comunitária”, apresentada em 20/02/2008

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